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segunda-feira, 28 de março de 2016

Eu contra mim mesmo




Já estive na tal Plaza de Toros, em Madri. Não entrei, claro. Jamais entraria para ver touradas... Mesmo sendo gaúcho, nem quando sangravam ovelhas/vacas (faz parte do "ritual" do churrasco nas fazendas) eu ficava por perto. Uma hipocrisia  de minha parte, admito... Afinal, ainda como carne... e animais são abatidos por alguém para que o bife chegue ao meu prato. Talvez um dia eu consiga mudar (evoluir?). Tomara!

Por outro lado, sempre detestei caçadas esportivas e vaquejadas (vaquejada: uma espécie de rodeio lá no Sul). É uma demonstração, na minha opinião, brutal, sádica e fora de propósito. Neste ponto, sempre tive sérios problemas de identificação com a tradição dos Pampas. Quando me levavam para ver aquilo, eu ficava furioso. Daí, um ou outro me chamava de mariquinhas. Eu também ficava furioso com isso (principalmente, porque nem sabia direito o que significava, mas era um "jeito 'negativo' de ser diferente" que me distanciava dos meninos; portanto, era algo que eu tinha que me tornava "inferior" e fazia com que me vissem como um "estranho"). Depois, com o tempo, já me "acostumando" com o "bullying" (diferente de outros "bullyings" – míope, baixo, gordo, judeu, negro, magricela, árabe, manco, surdo, dentuço etc. –, o do que não se encaixa nos padrões de gênero começa, ainda que de modo inconsciente/velado, bem antes, na própria família e/ou vizinhança, depois segue e se intensifica na escola, trabalho... e costuma ser "trancafiado" por muitos gays como uma bomba-relógio, um segredo muito dolorido dolorido, pelo resto da vida), fui impondo minha forma de pensar. Gostassem ou não, a opinião alheia já não me interessava tanto. Um mecanismo de autodefesa/sobrevivência, certamente... Cada um tem o seu.  

Mas confesso que para ver no campo uma "tourada" como a deste vídeo, eu iria, sim. É simbólica. A luta que travamos ao longo da vida contra a nossa verdadeira natureza. Pode ser feroz/indomável, mas não é nossa adversária/inimiga. Duelar... é bobagem. Melhor tentar aprender a viver/conviver com ela. 

"Como posso amar a grandeza do mundo se não posso amar o tamanho da minha natureza?" ("Perdoando Deus", conto de Clarice Lispector). 

Esta é uma das epígrafes do meu novo trabalho de ficção... 

  

segunda-feira, 21 de março de 2016

Estoque de bodes expiatórios



Dona Marina Silva aparece como uma das mais cotadas para 2018... Então o jogo é: não suportamos os "radicais" (como são chamados os petistas e afins), nem queremos mais os "vendilhões do templo" (como são chamados os da direita: PSDB, DEM & Cia.), mas podemos dar um voto de confiança aos conservadores (unidos/fortalecidos em impacientes/inflexíveis bancadas evangélicas)? Ora, pensei que os protestos eram, no fundo, contra a falta de isenção no poder. Questão religiosa à parte, como poderá alguém tão apegado a determinados princípios governar com isenção para um país tão heterogêneo, complexo e culturalmente rico?   

Bem...

... das quase 600 páginas da importante obra de João Silvério Trevisan, Devassos no paraíso (atualmente, por incrível que pareça, fora de catálogo), repito aqui este trecho para que possamos refletir sobre o atual momento de fúrias e revoltas (histeria coletiva que pode nos levar a dar mais um "tiro no nosso próprio pé"; já demos outros ao longo da nossa história):

“A verdade é que a civilizaç
ão sempre precisou de reservatórios negativos que possam funcionar como bodes expiatórios nos momentos de crise e mal-estar, quando então, por um mecanismo de projeção, ela ataca esses bolsões tacitamente tolerados.” (Record, 2000, p. 22, 3 ed.)

E vamos em frente (ou para trás)... 

quinta-feira, 17 de março de 2016

Meu Brasil brasileiro





Um (para o Outro, convicto): "Ora, latinos são os outros! Deus me livre! Bata na madeira! Sou alto, loiro, culto, tenho olhos azuis, sangue europeu (nórdico, claro!), um físico invejável e..."

O Outro (para Um, assombrado): "E uma cara de pau impressionante!"



domingo, 6 de março de 2016

Quem nasceu primeiro: o ovo ou a serpente?




Um amigo, numa “amistosa”, "culta" e "exemplar" mesa de churrascaria, indignado com a violência urbana, a falta de segurança, juízes que soltam bandidos, também com os "famigerados" defensores dos direitos humanos etc., etc., etc., lá pelas tantas, já meio alto, sai com essa depois de ver na televisão uma matéria sobre um fulano que tinha sido amarrado nu a um poste e sofrido linchamento (só não foi queimado vivo, porque chegou a polícia para "salvá-lo"):

"Bandido bom é bandido morto! Tem que amarrar mesmo, bater, deixar morrer e apodrecer na calçada, servir de exemplo pra bandidagem!

O outro amigo, que ouviu tudo aquilo calado, ainda solteiro, sem filhos, dá uma bicada no vinho e lança do lado oposto da mesa:

"Bandido bom tem que ser linchado e morto, feito os acusados de bruxaria na inquisição?"

"Claro!"

"Mas... e se for um dos seus filhos?"

O "paizão" logo se encrespa com aquele "absurdo":

"Porra, meu filho... por quê?"

"Não", o provocador tenta dar uma amaciada,"é apenas uma hipótese."

"Filho meu nunca vai ser bandido, porra!"

"Não, claro que não. Mas se, por infelicidade, ele cair numa cilada do destino e o tomarem como culpado numa parada esquisita... e daí um bando de gente furiosa correr atrás dele, amarrar o coitado num poste, tirar toda a roupa e bater nele até matar...?"

"Bandido bom é bandido morto, meu filho não é, nem nunca vai ser bandido, tá entendendo?"

"Evidente que não, mas numa histeria coletiva não há garantias pra ninguém."

Sem ter mais o que argumentar, o pai ofendido rosna:

"Você nunca casou, não tem filhos, deve gostar de homem, sei lá, nem me interessa.... Não sabe a bobagem que tá falando."

O outro sorri (vencido?) e faz um aceno de cabeça, concordando:

"É verdade, você tem toda a razão. Daqui a pouco, assim que esgotar o estoque de culpados mais óbvios, não duvido que comecem a amarrar nos postes as bichas, as lésbicas, os judeus, os muçulmanos, os macumbeiros, os ateus, os pinguços, os drogados e assim por diante. O fascismo começa desse jeito."

"Fascista é ser uma pessoa honrada e ter princípios cristãos, hein, seu comunista desgraçado?"

Depois disso, conta paga pelo provocador, a mesa ficou vazia. Acabou o jantar, a “amizade”, tudo.



terça-feira, 1 de março de 2016

Nosso "mea-culpa"




Meu pai era bastante criticado por ajudar nas "coisas da casa" (ou, como diziam os "machões" de plantão: fazer "trabalho de mulher"): varrer, limpar banheiros, passar roupa, arrumar a cama, mandar suas camisas e calças para a lavanderia, pôr outras roupas na máquina, estendê-las no varal, recolher tudo aquilo, cuidar da horta e cozinhar (até hoje não comi um "arroz de carreteiro" melhor que o dele, feito na panela de ferro).

Cresci, sim, como me diziam em tom de gozação na escola, "numa casa invertida". Minha mãe era dona de salão de beleza e de loja, viajava muito. A bagunça da casa era por conta do pai. Quando ela viajava, víamos filmes até de madrugada na cama de casal... e, no dia seguinte, ele fazia o chimarrão e o melhor leite com Nescau do mundo. Ficava ali, sentado na minha cama, cuia de chimarrão em uma das mãos, mamadeira na outra. Sim, tinha mais essa "exigência": eu só tomava todo o leite, se ele segurasse a minha mamadeira. Só larguei a mamadeira quando comecei a estudar de manhã, lá pelos 8 ou 9 anos. Depois tive que usar aparelho nos dentes por mais de uma década, mas isso é só um detalhe insignificante... 

Digo hoje pra mim mesmo: "Puxa, que bom que meu pai andava na contramão de uma porrada de idiotices". Preconceito, foi uma das coisas que ele mais me mostrou que era uma furada, comportamento de gente tacanha. Futebol, ele não era fanático nem pelos jogos da Copa. Time, acho que nunca teve. Se teve/tem, não me lembro de tê-lo visto acompanhando algum campeonato ou jogo.


Com 17 anos, saí de casa sem medo de enfrentar a vida sozinho, pois já tinha aprendido com os dois (pai e mãe) a fazer de tudo (inclusive, bainha de calça com ponto pé-de-galinha. Duvidam? Perguntem a quem já me pediu para fazer tais "serviços". Não deixo um ponto aparecendo do outro lado do tecido. Se aparecer, arranco a linha... começo tudo de novo. rsrsrs!)  


E hoje vejo tantas famílias, em nome do tal amor incondicional, caindo na mesma armadilha machista de gerações anteriores, criando filhos extremamente dependentes e folgados... Mães que se desdobram para dar conta de tudo, maridos omissos (por conveniência, incompetência ou falta de pulso, sei lá)... 


Vamos ver no que vai dar tudo isso.  


Tomara que alguns caras bobalhões façam o "mea-culpa" que esse tiozinho do comercial de sabão em pó fez.  


Tomara! Ainda dá tempo!