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sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Tempo de despedidas



Outro amigo que se vai, um livreiro com 60 anos de experiência na área editorial...

Hoje, logo cedo, recebi a notícia de falecimento de Jair Canizela (http://d-app.cbl.org.br/e/6644/1551/45260/03b61).

Quando vim para São Paulo,aos 17 anos, e indicado por outra amiga, Jussara Dias​, fui até a livraria da editora Vozes, na Haddock Lobo, meio quarteirão da Paulista, no prédio do Colégio São Luís. Era para ser divulgador, visitar colégios, redações de jornais e produção de programas de rádio e TV. Eu ainda não havia trabalhado com carteira assinada, não tinha experiência alguma em absolutamente nada. E o pior: aos 17 anos, graças ao famigerado serviço militar obrigatório, é muito difícil darem emprego aos rapazes. 

Sentei diante dele e fui muito franco, quando me foi perguntado o que eu sabia fazer:

"Não sei nada. Mas quero aprender tudo."

Ele sorriu meio espantado, e rebateu aquilo com uma pergunta:

"Quanto pretende ganhar?"

Eu: "Meio salário, tá ótimo..."

Sim, naquele tempo era comum pagarem meio salário para um iniciante. 

Ele, então, voltou a me encarar, agora mais sisudo, e disse:

"Ah, assim não vai dar... porque eu quero lhe pagar dois salários mínimos."

No auge da minha ingenuidade, gelei, achando que ele falava sério. Que nada, fui contratado no mesmo dia, "por dois salários". Aquilo foi um "feito", algo impensável. Puxa, dois salários, mais comissões! Era demais para mim!!!!

Meu primeiro emprego. Um caminho que nem eu mesmo sabia para onde iria me levar.

Na Vozes, conheci a Rose Marie Muraro (falecida em 2014), grande mulher! Nas redações, conheci editores importantes, que me fizeram chegar a alguns escritores consagrados... Entre eles, o Caio Fernando Abreu (falecido em 1996)... que me disse: "Você tem que escrever sobre os seres da noite de Sampa, mostrar essa gente sem as máscaras, a solidão delas."

Enfim, foi ali, assinando aquele primeiro contrato de trabalho, que tudo começaria... Mais adiante, o Jair Canizela seria o primeiro distribuidor (ele já era um dos donos da Distribuidora Loyola) a pegar consignação da minha editora. Todos, em maior ou menor intensidade, acreditavam nos meus "desatinos".

Obrigado, Jair, por tudo! Até mesmo pelas brigas que tivemos. Brigávamos muito, mas, no final, acabávamos nos entendendo... sempre.