CENA 1
Duas coroas esperam sentadas (qualquer lugar serve; depois de certa idade, tudo é espera para elas).
Judith - (sem muita vontade de falar, porém incomodada com o silêncio da outra) Então, né...?
Verônica - É...
Judith - E a senhora, como anda?
Verônica - Nem muito lá, nem muito cá.
Judith - Tudo na mesma?
Verônica - Não. Ultimamente, piorando.
Judith - (falsamente solidária) Nossa!
Verônica - E a senhora, tem feito o quê?
Judith - O de sempre.
Verônica - Michê! Jesus, ainda?
Judith - Cada vez menos, mas não posso me queixar.
Verônica - Uau! Uma teimosa entre nós!
Judith - Não, uma sobrevivente. Teimosa é a senhora, que ainda consegue estar viva com essa cara amassada, esse corpo tombado e esse veneno todo borbulhando aí dentro. Devia ser estudada pelo Instituto Butantã... ou pela Nasa.
Verônica - E eu sinto é pena...
Judith - De mim?
Verônica - Não, dos seus clientes, meu bem.
Chega a terceira, tinha saído para comprar churros, mas voltou com meio saco de pipoca doce.
Judith - (para Gil) E os churros, criatura?
Gil - Comprei.
Verônica - Cadê?
Gil - Sou compulsiva, comi.
Judith - Os três?
Gil - (para Judith) Na verdade, com o dinheiro que a senhora me deu, pude comprar cinco, para ver se trazia dois.
Judith - E comeu os cinco?
Gil - Seis. Com o troco, comprei mais um e esta pipoca. Sobrou um pouco, querem? Odeio pipoca! Comprei por comprar, também sou compulsiva em gastar grana dos outros.
Verônica - (para Judith) Tem jeito, não. Avisei pra não confiar nessa draga.
Gil - Credo! Quanta intolerância!
Judith - Não, é raiva mesmo!
Gil - Inveja, meu bem! Posso devorar um boi, mas não sou como vocês, que engordam até com o vento.
Judith - Pra emagrecer, a gente fecha a boca. Mas pra você ficar bonita, querida, nem com reza forte. Nascendo de novo, talvez.
(... e o texto segue...)
© Felipe Greco
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