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terça-feira, 27 de setembro de 2011

Rosiléa Marques: Mulher Coragem


Em 2010, graças a um Prêmio de Interações Estéticas que recebi da Funarte, pude trabalhar durante alguns meses em uma ONG LGBT de Niterói (RJ). Lá, conheci pessoas muito ricas – no melhor sentido do termo. Uma, porém, em especial: Rosiléa Marques, presidente do Grupo Diversidade Niterói (GDN). Mulher sincera, de rosto, olhar e atitudes fortes. Ao descobrir (ou ter a certeza de) que seu filho era gay, decidiu abraçar a causa...

Qual causa? 

Bem, é verdade que ela acabou assumindo as rédeas do GDN – grupo, aliás, fundado pelo filho. Antes disso, segundo ela própria contou em um dos encontros que tivemos com o grupo, andava com problemas de baixa autoestima e hipertensão – por outras razões, nada a ver com a descoberta sobre a orientação sexual do filho. Ao se envolver no dia a dia da ONG, sarou. A agitação, a militância, tudo isso passou a funcionar como um remédio para ela. 

Fiquei encantado com essa mulher desde o primeiro dia em que nos encontramos na sede do GDN: ela, um pouco tímida; eu, apavorado. E à medida que os dias foram passando, ao tomar conhecimento de outras lutadoras iguais a ela, que têm um útero do tamanho do mundo e que são capazes de gerar infinitamente seus filhos (de sangue ou não) ao longo da vida, mudei bastante minha forma de encarar a maternidade. Percebi que mãe de fato é aquela que consegue gerar e parir infinitamente a cria: não apenas para que o embrião se desenvolva, saia de dentro dela e respire sozinho pela primeira vez, mas para que ele, sempre que precisar, sinta-se importante, forte, revigorado, enfim, renascido!  
 
Olhar de verdade para o rebento e aprender a respeitar sua individualidade é algo que poucas mães conseguem. É como se fosse o segundo, terceiro, décimo, milionésimo parto. Mulheres com esse dom divino não param nunca de puxar o filho de volta para o ventre. E vão pari-lo incansavelmente até que ele esteja pronto para respirar e andar outra vez por conta própria. Mulheres como Rosiléa Marques – com braços e colo sempre prontos para ninar a(s) cria(s) – são eternas parideiras, mães de multidões. 
 
Portanto, entendo que a causa pela qual Rosiléa Marques resolveu lutar não foi apenas a dos homossexuais e excluídos em geral, mas a da mãe que a um só tempo é guerreira e doce; zelosa e também enérgica; da mulher que se entrega, mas não se anula; e que respeita as pessoas... Ah, porque não perde tempo em julgar. Ou seja: é a luta pelo Afeto, pelo Amor Incondicional pelo Outro

E eu me sinto privilegiado por também ter sido parido e acalentado por essa minha outra mãe! Sou mesmo um cara sortudo, pois tenho minha mãe de sangue... e ainda outras tantas que a vida foi me apresentando! 

Bênção, mães!


segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Quem avisa, amigo é!


Vamos lá, tentando explicar mais uma vez aos insistentes de plantão:

Nunca fui filho, irmão, tio, primo ou amigo muito presente. Não sou de fazer nem de receber visitas demoradas. Não que eu não goste da companhia das pessoas que amo, mas, para ser franco, não sinto necessidade de estar fisicamente próximo. Nem na minha cama deixo alguém ficar mais que o necessário. Dormir junto, está fora de cogitação! Tá bom, meu cachorro pode. Mas cada um com o seu lençol.

Mantenho meus afetos à distância para preservá-los (de mim, principalmente). Mas é óbvio que sou taxado de esquisito, um cara cheio de manias, neurótico, antissocial, possuído pelo capeta, herege, enfim, costumo receber todos esses rótulos que as pessoas inventam na vã tentativa de classificar o inclassificável.

Meus pais eu vejo de quatro em quatro anos (por viverem longe, até mais); sobrinhos, uma vez na infância e outra já na fase adulta; primos, nas redes sociais; amigos que estão na mesma cidade, uma vez por ano, quando dá – todos trabalham muito e têm suas vidas para cuidar. De uns tempos pra cá, é cada vez mais frequente nos encontrarmos no velório de um ou de outro. Com a idade avançando, isso, além de inevitável e necessário, passa a ser corriqueiro. Refiro-me à morte, claro. E por aí vai... Mas não deixo de buscar notícias, torcer para que estejam bem, com saúde e felizes. E não vejo nada de abominável nisso de não ser tão aparecido. Pelo contrário, é uma forma de respeito. Se alguém precisar de algo, estarei ali, pronto para o que for – e sem fazer perguntas e/ou cobranças. Voltarei para o meu casulo depois. Porém nunca, nunca sumirei completamente.

Outra coisa que as pessoas costumam me cobrar é o fato de eu não gostar de sentar para falar de livros, literatura, cinema, teatro, arte em geral. Bem, não gosto mesmo. Fico entediado. Não sou fã de nenhum artista nem de obra alguma (não por mais de cinco minutos). Não possuo a grandeza do público, sou mero criador. Talvez seja um defeito, but... Como se diz: “Que atire a primeira pedra quem for perfeito”. Trabalho com textos, conto histórias, mas isso não é tudo em minha vida. Há outras coisas em meu cotidiano que também me dão alegria e até conseguem me transformar bem mais; nem por isso saio por aí propagando pelos quatro cantos que isto me deixa mais feliz do que aquilo... Sim, felicidade é algo muito particular e intransferível. Gosto, idem. Cada um com o seu e pronto.  

Definitivamente, detesto imposições sociais, que, em minha opinião, servem apenas para uniformizar/manipular as pessoas. Respeito o conhecimento, mas não acredito em moldes/modelos. Como já foi dito por alguém, “viver é contrariar”! Pois é, concordo... 

Quando morrer, talvez eu mude de ideia. Se acontecer mesmo, isto é, se eu mudar de ideia, volto pra contar. Prometo! Vou adorar aparecer, no meio da noite, para os chatos que pegaram tanto no meu pé – alguns querendo receitar orações, banhos de ervas, deuses, versículos, macumba, divãs, pílulas, choques, ebó, regressões, até exorcismos! Xô! Vão cuidar da vida! Se não têm vida própria, tratem de arranjar uma! Mas me deixem quieto no meu canto! Tô avisando, hein! Ai, ai, ai! Depois não reclamem!

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Desistir, jamais!


Em 2007, uma amiga editora me chamou para conversar... e fez uma proposta inusitada: produzir um roteiro de história em quadrinhos para o clássico Dom Casmurro, de Machado de Assis. 
Como assim escrever um roteiro de HQ? Embora eu já tivesse escrito para cinema, jamais tinha parado para pensar em como seria um roteiro para uma história em quadrinhos. Por onde começar? Como produzir algo para ser transformado em desenhos? E logo Dom Casmurro, um dos meus traumas de leitor iniciante, quando nas escolas nos enfiam goela abaixo os tais clássicos! Nada contra esse tipo de obra, mas tudo que nos é imposto acaba gerando repulsa/antipatia. Em especial, na adolescência.
Enfim, arregacei as mangas e enfrentei o desafio. Depois de ler/estudar várias e várias vezes o romance e de fazer incontáveis pesquisas (vestuário, arquitetura, decoração, comportamento etc.), comecei a trabalhar na adaptação. Mesmo tendo conhecimento de obras de outros autores que também se atreveram a mergulhar no universo machadiano, preferi fazer a minha própria leitura, buscando o máximo de fidelidade à obra original. E foram quase dois anos de trabalho árduo. Durante o processo de criação do roteiro, alguns profissionais desistiram de participar do projeto – inclusive a própria editora que havia feito o convite. Afinal, além de arriscado, era algo extremamente cansativo. Não tinha remuneração alguma, apenas a vontade de que todo aquele tremendo esforço não fosse em vão. 
 Quando finalizei o texto, havia apenas um jovem artista disposto a enfrentar a maratona de transformar em desenhos as quase 200 páginas de roteiro: Mario Cau. Admito que só concluí minha parte do trabalho, porque não sou de desistir de nada. A partir daí, o Cau tomou as rédeas, e não me deixou jogar tudo no fogo. Pois bem, quase cinco anos depois, nosso projeto acaba de receber da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo um belo prêmio/incentivo. Portanto, correndo tudo bem, será finalizado e lançado em 2012. Agora, começaremos a conversar com editores para avaliar/negociar propostas. Depois de tanta dedicação e espera, merecemos um livro, no mínimo, muito bem editado/lançado.
Obrigado, Cau, pelo seu talento! Pela sua teimosia! Tenho aprendido muito com você. Principalmente, a lidar melhor com o tempo das coisas!